O material reunido na Divisão de Manuscritos da Biblioteca Nacional é revelador: segundo a pesquisadora, tais estudos eram bastante difundidos no Brasil nesse período, tendo influenciado um significativo conjunto de pesquisadores nacionais, que desenvolveram entre nós os estudos afro-brasileiros (produção acadêmica que analisou a identidade africana na sociedade brasileira) e contribuíram para o avanço de posicionamentos antirracistas em um contexto de grandes traumas humanitários no mundo ligados à ideia de raça.
A pesquisa da historiadora Heloísa Teixeira reconhece Arthur Ramos como um dos intelectuais mais engajados nessa empreitada. Com Afrânio Peixoto, Anísio Teixeira, Édson Carneiro e outros intelectuais brasileiros, o antropólogo criou um importante centro de pesquisa das relações raciais no Brasil, que ficou conhecido como Escola Nina Rodrigues. Além das pesquisas, esse grupo tinha como objetivo a edição ou reedição de estudos acerca do negro e da sobrevivência da cultura africana no Brasil, o que foi feito através da Biblioteca de Divulgação Científica, da Editora Civilização Brasileira, dirigida à época pelo próprio Ramos. O antropólogo deixou uma produção de mais de 500 obras, entre livros e artigos, muitos dos quais traduzidos para o inglês e para o francês. Dentre seus escritos, destacamos: O negro brasileiro (1934); Estudos do folclore (1935); As culturas negras no Novo Mundo (1937); Introdução à antropologia brasileira (dois volumes editados nos anos de 1943 e 1947); As Ciências Sociais e os problemas do após-guerra (1944); A mestiçagem no Brasil (1952); O negro na civilização brasileira (1956).
A correspondência de Arthur Ramos compõe parte do Arquivo Arthur Ramos que, além das correspondências, mantém recortes de jornais, folhetos, fotografias, originais manuscritos, pesquisas e estudos sobre educação, medicina legal, psiquiatria, psicologia, sociologia, antropologia, folclore e etnografia. Ao todo, o Arquivo – publicado pela Biblioteca Nacional – possui cerca de 5 mil documentos, divididos em 4.860 verbetes e organizados em um inventário analítico.
Heloísa Teixeira é formada em História pela Universidade Federal de Ouro Preto e fez mestrado, doutorado e pós-doutorado em História pela Universidade de São Paulo. Ela já investigou a escravidão e os processos de liberdade no Brasil oitocentista e se interessa pela historiografia referente à população negra e à temática do racismo. Buscando as raízes das pesquisas sobre o negro no Brasil, conheceu o trabalho intelectual de Arthur Ramos e, graças ao apoio da Fundação Biblioteca Nacional – por meio do Programa de Residência em Pesquisa na Fundação Biblioteca Nacional –, dedica-se com exclusivamente à análise do diálogo desse intelectual com outros pensadores nos anos 30 e 40, estudando sua influência para a consolidação das ciências sociais no Brasil.