Conquanto pulverizasse na imprensa duras críticas ao regime, Pompeia assumiu postura francamente florianista, colhendo inimizades, inclusive entre antigos parceiros de letras e ideologia, como Olavo Bilac e Luís Murat. É sob rumores de protegido do ditador que ele assume, em 1894, a direção da Biblioteca Nacional, onde permanece até 1895, após a deposição de Floriano por Prudente de Morais, que também exonerou o escritor da função de professor de Mitologia na vizinha Escola de Belas Artes. Nesse biênio conturbado, envolveu-se em muitas querelas na imprensa e desgastou-se psiquicamente, tendo cometido suicídio em dezembro de 1895.
Sua breve passagem pela Biblioteca Nacional carece de estudo mais acurado. Seus principais biógrafos abordam-na muito superficialmente, pois privilegiam as acaloradas discussões na imprensa nesse período. A lacuna difunde a falsa ideia de uma direção anódina, mas, de acordo com valiosos documentos depositados na Biblioteca Nacional, temos acesso à contribuição efetiva de Pompeia.
O objetivo do projeto de pesquisa do doutor em Letras Gilberto Araújo – no âmbito do Programa Nacional de Apoio à Pesquisa, edital 2017, da Biblioteca Nacional –, intitulado A produção verbovisual de Raul Pompeia no acervo da Biblioteca Nacional, não é propriamente recuperar detalhes biográficos da atuação de Raul Pompeia como diretor, visto que a documentação a respeito desse importante escritor na Biblioteca Nacional é muito mais rica e variada, ultrapassando, com larga folga, a virada de 1894 para 1895: sua primeira publicação registrada na instituição data de 1874, aos 11 anos de idade. A intenção do pesquisador é estudar as obras de Raul Pompeia que promovem a convivência de signos verbais e visuais, de modo a permitir análise articulada e sistemática dessas duas linguagens, aqui componentes de um complexo semiótico pioneiro nas artes brasileiras do século XIX.
Segundo Gilberto Araújo, trata-se de rastrear ressonâncias da produção plástica na obra estritamente literária do autor, rompendo a fronteira entre a pena e o pincel. O autor parte de quatro focos de pesquisa:
- caricaturas e charges na imprensa periódica;
- ilustrações do romance O Ateneu;
- poemas em prosa (“canções sem metro”) ilustrados; e
- capas, ilustrações dispersas e vinhetas de obras próprias e/ou alheias.
Alicerçado em material ainda não explorado, o projeto tem como fonte de pesquisa principal o acervo da Biblioteca Nacional, onde, no caso de Raul Pompeia, ex-diretor da instituição, repousam vários itens únicos exclusivos, como manuscritos, cartas e desenhos originais.
Gilberto Araújo é professor adjunto de Literatura Brasileira e professor do Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da UFRJ. Doutor em Letras Vernáculas pela mesma instituição, publicou diversos ensaios e fez palestras no Brasil e no exterior, tendo passado por centros culturais e universidades de Lisboa, Coimbra, Porto, Aveiro, Madri, Paris (Sorbonne Nouvelle III, IV e VIII), Lyon, Londres (King’s College), Viena, Pádua (Itália) e Santiago do Chile. Integra o projeto Portugueses de Papel, associado à Universidade Nova de Lisboa, à Université Sorbonne Nouvelle – Paris 3 e à University of Colorado (Boulder, EUA). Organizou as Melhores crônicas de Humberto de Campos (Global, 2009) e preparou, para a Unicamp, a reedição das Canções sem metro, de Raul Pompeia, livro sobre o qual escreveu sua dissertação de mestrado. Prefaciou e organizou a última edição de O Ateneu lançada em Portugal pela editora Glaciar, em parceria com a Academia Brasileira de Letras. Em 2015, prefaciou, para a Imprensa Oficial Graciliano Ramos, a reedição de Ninho de cobras, autor sobre cuja obra tem se debruçado nos últimos anos, pois organiza sua reedição pela Editora Contracapa. É autor do livro de ensaios Literatura brasileira: pontos de fuga (Verve, 2014), Júlio Ribeiro (ABL, 2011), dentre outros títulos. Foi pesquisador da Academia Brasileira de Letras, condição em que preparou e prefaciou reedições de Artur Lobo, B. Lopes, Júlia Cortines, Luís Guimarães Júnior e outros. Atualmente, desenvolve e orienta pesquisas sobre o poema em prosa no Brasil e as relações entre literatura brasileira, gastronomia e artes plásticas. É bibliófilo.