O ano de 1987 seria de fato a data onde o movimento antimanicomial se firmaria como força social relevante, com a divulgação do chamado “Manifesto de Bauru”, que entre outras coisas instituía o lema do movimento: por uma sociedade sem manicômios. Logo ganhou vida a Articulação Nacional da Luta Antimanicomial, guiada pelos princípios do manifesto. O movimento desde então busca levantar discussões sobre a loucura para além do limite assistencial, em prol de novos métodos de tratamento de forma humanizada, não-institucionalizada, tendo por objetivo tornar pública a luta pelos direitos das pessoas em sofrimento mental, pelo bem-estar e pela dignidade desses indivíduos e de suas famílias, envolvendo atividades que em muito ultrapassavam as do campo convencional da saúde. Seu objetivo principal era o fim das instituições manicomiais e o desenvolvimento de serviços de saúde abertos, para além dos muros de hospícios e manicômios, vistos como dispositivos incutidos de violência física e simbólica que, através de uma aparência protetora, isolavam da sociedade aqueles indivíduos considerados “loucos”, invisibilizando dessa forma os processos sociais e históricos de produção de loucura, isentando a sociedade de culpa nesse processo eminentemente social. Importante para o movimento era a contextualização histórica do próprio diagnóstico, sempre em constante mudança, do que seria de fato a loucura, vista como construção ideológica: pessoas com problemas de depressão, alcoolismo, mulheres e todos aqueles que, de uma forma ou de outra, não se adequavam aos padrões de moralidade impostos pelos bons costumes e pela lógica do trabalho produtivo, já foram considerados loucos e internados nessas instituições.
Na foto, temos Nise da Silveira e sua turma da faculdade de Medicina da Bahia, na década de 1920. Dra. Nise foi uma das primeiras brasileiras da história a se formar em Medicina, e seu trabalho e estudos sobre a psiquiatria tornou-a uma das precursoras da reforma psiquiátrica no Brasil, tendo fundado nos anos 1950 o Museu de Imagens do Inconsciente e a Casa das Palmeiras, dois importantes espaços de reabilitação da saúde mental a partir de terapia ocupacional e artes, um dos grandes legados de Nise da Silveira para a luta antimanicomial brasileira e mundial.
(Thiago Alencar)