Ave Libertas e a luta pela libertação de escravos

sexta-feira, 15 de maio de 2020.
Notícia
Ave libertas, Libertação dos escravos, luta, Fundação Biblioteca nacional
Quando se fala do movimento abolicionista, logo vem à mente os nomes dos líderes homens de maior projeção, perpetuados merecidamente em nossa memória e na história. Porém, pouco se lembra da ativa participação feminina no movimento e nas ações antiescravistas.

Mulheres que atuaram no espaço público e participavam, junto aos homens, de diversos dos muitos clubes e associações abolicionistas na segunda metade do século XIX e que até mesmo fundaram suas próprias associações. Como, por exemplo, as pernambucanas Leonor Porto, Odila Pompilio e Maria Albertina do Rego que, junto a diversas outras, fundaram em Recife uma sociedade abolicionista só de mulheres, a Ave Libertas. No estatuto da Sociedade, declaravam seu objetivo: “promover a libertação de todos os escravos do município do Recife por todos os meios lícitos e legais ao seu alcance”. Na prática, promoviam eventos, conferências e levantamento de fundos para a concessão de cartas de alforria. Ao completar um ano, as mulheres da Ave Libertas haviam libertado, através da compra de alforrias, aproximadamente 200 escravizados.

Fundada em abril de 1884, a Ave Libertas foi instalada em setembro do mesmo ano, em cerimônia no Teatro Santa Isabel, na capital pernambucana. No discurso de fundação, Maria Albertina do Rego estimulou a participação feminina na luta contra a escravidão, admitindo que a educação dada às mulheres brasileiras na época seria um sério obstáculo a essa participação, mas lembrou que não era um impedimento e que elas deveriam ignorar as censuras que por certo sofreriam. No mesmo discurso (que pode ser lido em http://memoria.bn.gov.br/docreader/705110/21362), Maria Albertina relembrou que a luta da Ave Libertas não se limitava ao fim da escravidão mas também abrangia a educação e inserção dos negros libertos na sociedade.

Em 1885, a Sociedade Ave Libertas organizou um grande festival comemorativo do 25 de março, data da abolição no Ceará, a primeira província do país a abolir a escravidão, com passeata nas ruas, cerimônia de benção do estandarte da Sociedade pelo bispo na matriz de Santo Antônio, conferências e apresentações no Teatro Santa Isabel. A programação completa pode ser vista em http://memoria.bn.gov.br/DocReader/029033_06/12569.

 No mesmo ano, promoveu uma comemoração artística e literária do seu primeiro aniversário no Club Carlos Gomes onde, além das apresentações musicais, foram realizados discursos e concedidas cartas de alforria (http://memoria.bn.gov.br/DocReader/705110/23070). Na ocasião, também lançaram uma publicação comemorativa, com artigos de propaganda abolicionista escritos por mulheres e que pode ser encontrada na hemeroteca digital (http://memoria.bn.gov.br/DocReader/029033_06/20111). Na capa, um retrato ilustrado de Leonor Porto, presidente da Aves Liberta à época. Em suas páginas, Maria P. Vilella dos Santos se declarava “amante da minha pátria e abolicionista de coração”. Sophia Pauslavine, Odila Pompilio (primeira presidente da sociedade) e Ernestina Uchoa escreveram versos. Ismênia Maria Duarte Pinheiro e Carlota Alves lembravam a presença da mulher nas conquistas do progresso e da liberdade. 

A publicação destaca também as “injúrias e apodos” e as “imprecações hydrofóbicas” com que as mulheres abolicionistas eram atacadas por seus adversários escravocratas, que as chamavam de “pretoleiras”. Aos ataques, respondem com a lembrança das cerca de 200 alforrias conquistadas e com estímulo para a luta. Pois, como escreve Adelaide Porto, “sou abolicionista e jamais curvarei a fronte perante o interesse mesquinho, que nos pode trazer o captiveiro de nossos irmãos”. Afinal, Zulmira Monteiro resume: “a escravidão é um crime”.

 (Maria Angélica Bouzada)