Isadora Duncan, “a arte é maior que a vida”.

sábado, 30 de maio de 2020.
Notícia
Isadora Duncan, Arte, bailarina, Fundação Biblioteca nacional
Em 27 de maio de 1877, nascia em São Francisco, EUA, a bailarina norte-americana Ângela Isadora Duncan. Isadora desde pequena despertava o interesse pela dança. Iniciou no balé clássico aos 4 anos de idade e desde muito jovem questionava a disciplina rígida do balé. Aos 11, já lecionava para crianças da vizinhança, sempre acompanhada das sessões de piano de sua mãe. Nesse momento, já desenvolvia um estilo próprio. Mais tarde, rumou para Chicago, a cidade dos espetáculos teatrais. Lá, Isadora ingressava para a companhia de Teatro de Augustin Daly em 1896, levando-a na sequência a Nova Iorque, onde sua percepção de dança conflitava com as apresentações ao público.

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Isadora Duncan - Revista da Semana (RJ)
Isadora Duncan - Revista da Semana (RJ)

Foi em Nova Iorque que começou a ter aulas com Marie Bonfanti, mas não demorou muito para se incomodar com a rotina extenuante, cujos parâmetros convencionais reservavam às mulheres posição coadjuvante. Defensora da liberdade e dos direitos das mulheres, percebia que seus posicionamentos políticos e estéticos não eram bem vindos. Em 1899, decidiu se mudar com a família para Londres. Conquistou um público cativo com ajuda do pianista e maestro Charles de Halle na “New Gallery”. Durante as apresentações, Isadora combinava dança, música e interpretação, desenvolvendo uma arte multidisciplinar.

De Londres segue para Paris, onde conhece a artista Loie Fuller durante uma apresentação na Exposição Universal de 1900. O contato com a também dançarina norte-americana reafirmava sua crença em expressões corporais para além do balé tradicional. Em companhia de Loie Fuller, excursionou pela Europa. Na Alemanha, patrocinada pelo empresário Alexander Grosz, passou a criar espetáculos solo. Sua técnica inovadora depreendia profunda conexão com o corpo e seu movimento natural. Não se adequava a regras preestabelecidas. Sua dança era inspirada nos ícones da Grécia Antiga e no trabalho escultórico, que demandava o constante moldar do corpo.  Despida de adornos: laços, meias, espartilhos, sapatilhas, propunha uma dança fluida, livre. Cabelos soltos, pés descalços. Corpo coberto somente por uma túnica de gaze. Sem maiores aparatos, seus movimentos atingiam o gestual necessário, cujo corpo sinuoso expressava afetos, sentidos e espaços cada vez mais amplos.

Parte de sua arte performática guarda influência de François Delsarte (1811-1871), cantor, filósofo e teórico do movimento, que colocou em prática fundamentos corporais, cuja estética se expressava em dimensões espiritual e metafísica. Duncan foi quem disseminou sua pedagogia para as escolas de dança na Europa. Inicialmente na Alemanha, depois Paris, URSS e EUA. A criação de escolas se tornou um dos grandes projetos de Duncan, chegando inclusive a adotar algumas de suas alunas. As pupilas e, mais tarde, propagadoras de sua arte recebiam a alcunha de “Isadorables”.

Com o início da grande guerra, Duncan retornou aos EUA. Em 1915, apresentou o espetáculo “A Marselhesa” no Metropolitan Opera House em Nova Iorque.  A performance incluía movimentos inspirados em uma estética militar, convocando a plateia a integrar a luta pela liberdade. O espetáculo evidenciava mais uma faceta de Duncan. Ela acreditava na dança como uma elevação espiritual de comunhão entre corpo e mente, logo de sublimação da materialidade do corpo. Assim, todos alcançariam a liberdade e gozariam de princípios básicos, como a igualdade de direitos. Sua utopia política é exibida na coreografia “March Slav”, de Tchaikovsky. A associação de clássicos com performances de caráter transgressor era incomum para época e causava grande alvoroço entre a crítica especializada. Na peça, Duncan representava um camponês em posição subjugada. A canção “Deus salve o czar” era usada para marcar a queda do camponês que a seguir se rebelava. Tais temáticas alinhavam-se ao ideal comunista por ela defendido, fato comprovado pelo convite do governo soviético para administrar uma nova escola. Em 1921, encena na URSS a peça “Revolucionários”.

A trajetória de Isadora Duncan é marcada por amores e tragédias, momentos dramáticos, como a perda dos 2 filhos biológicos em um acidente de carro, seguido de afogamento. De paixões e um casamento ao final da vida, que, ao que se sabe, fora arranjado para facilitar a entrada do marido, o russo Serge Essenin no retorno aos EUA após deixar a URSS. É possível, pois não acreditava na instituição do casamento. Entre algumas curiosidades, destacam-se um recital inspirado nas três graças de Botticelli no qual se apresenta grávida, sua passagem em 1916 no Teatro Municipal do Rio de Janeiro e as investidas não correspondidas de Auguste Rodin e Gabriele d’Annunzio.

Morreu em 14 de setembro de 1927 em um acidente insólito. Durante um passeio de carro, a echarpe que usava no pescoço se enrolou no pneu do carro, enforcando-a.

Isadora Duncan deixa um legado celebrado até os nossos dias. Precursora da dança moderna, transformou o ato de dançar, experimentando a fusão entre o corpo e o espírito. Diziam que Isadora se movimentava como as águas, tamanha a delicadeza, porém sempre intensa. Com tamanha potência, Isadora Duncan, ensina e inspira, despida de preconceitos, o sentido mais caro à arte: liberdade!

Na imagem matéria da edição de setembro de 1916 da Revista da Semana em homenagem à “A Divina Isadora”. A hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional dispõe dessa e de outras matérias da Revista da Semana, conforme os links abaixo: