Ostensor brasileiro retratou o país

domingo, 10 de maio de 2020.
Notícia
Ostensor Brasileiro, coleção, Fundação Biblioteca nacional
Em 2010, a Fundação Biblioteca Nacional lançou uma garbosa edição fac-similar da coleção completa do Ostensor Brasileiro. Mas, o que teria sido ele? Simplesmente uma das primeiras e mais importantes publicações literárias da imprensa periódica brasileira. Considerado uma publicação de vanguarda na imprensa da época – tanto no textual quanto por sua qualidade gráfica –, foi editado com imensas dificuldades. Teve poucos leitores e vida curta. Ainda assim, pretendia, em suas palavras, “civilizar o povo”. Vale a pena conhecê-lo.

O Ostensor Brasileiro foi, segundo seu subtítulo, um “Jornal litterario pictoreal”, criado no Rio de Janeiro (RJ) em 1845 – tempo em que, apesar de já ser imperador, Dom Pedro II somava apenas 20 anos. Sua criação e sua direção ficaram a cargo do poeta e romancista português Vicente Pereira de Carvalho Guimarães, com João José Moreira assumindo a administração financeira. Sua segunda folha de rosto o definia como uma “Collecção de producções originaes em prosa e verso sobre assumptos pertencentes á historia politica e geographica da Terra de Santa Cruz”.

 

A palavra “ostensor”, do latim “ostensore”, significa “aquele que mostra ou ostenta”, revelando a intenção do periódico em retratar o Brasil, conforme exposto em seu editorial de lançamento. Ali, o Ostensor Brasileiro era definido como

(...) huma destas emprezas atrevidas, que os indifferentes julgam loucas, e os amigos impossíveis; o plano circumscripto, que nos impuzemos de tratar exclusivamente de objectos relativos, ou pertencentes ao Brasil [,] constitue a primeira parte do nosso programma, e a maior das difficuldades a vencer, segundo querem aquelles que de trabalhos mentaes só esperam como unico premio hum pouco de oiro vil; a segunda, (...) reduz-se a fallar aos olhos e ouvidos juntamente, segunda e mui grave difficuldade, por que não havendo em nosso jornal lugar para traducções de artigos, que não tenham immediata relação com o Brasil, não podemos utilisar gravuras feitas em França ou Inglaterra, e grandioso dispendio, e trabalho insano nos custará o empenho. (...) He preciso civilisar o povo, dizem todos, e o jornal litterario he uma poderosa alavanca da civilisação.

Quando criado, o periódico objetivava promover a leitura no Império, democratizando a informação a todas as camadas sociais brasileiras e buscando valorizar escritos sobre o Brasil, feitos por e para brasileiros. Nesse sentido, procurando seguir os interesses do público leitor para uma circulação mais abrangente, traduções de textos de viajantes estrangeiros ao Brasil não tinham espaço em suas páginas.

As edições do Ostensor Brasileiro eram impressas e vendidas na editora dos irmãos Eduardo e Henrique Laemmert, no nº 77 da Rua da Quitanda. Cada uma contava oito páginas divididas em duas colunas de texto, com ilustrações em folhas separadas, retratando personalidades ilustres do Império ou paisagens brasileiras do Segundo Reinado – quase todas foram realizadas pela empresa litográfica Heaton & Rensburg. Na parte textual, o periódico trazia poesia, romances, artigos, ensaios, correspondência, biografias, efemérides, relatos de viagem, entre outras coisas.

Sem grandes divisões entre o que era História e ficção literária, o jornal abordou temas e questões como espaço urbano carioca, educação primária no Brasil, preservação do patrimônio histórico e ambiental, condições sociais das mulheres, a necessidade de unidade entre as nações sul-americanas, problemas políticos e administrativos enfrentados pelo Império, geografia e paisagens brasileiros, povos indígenas e suas relações com colonizadores, história do Brasil, particularidades de vilas e cidades brasileiras, religião, jesuítas na América do Sul, instituições cariocas, guerras e revoltas, literatura clássica, liberalismo, pan-americanismo, valores e conceitos morais, personalidades históricas, etc. Em suas edições destacaram-se os romances históricos Jerônimo Barbalho Bezerra (possivelmente o primeiro romance histórico brasileiro), situado durante a Revolta da Cachaça (1660) e A guerra dos emboabas, ambos de Vicente P. C. Guimarães.

Apesar de sua qualidade, o Ostensor Brasileiro teve poucos leitores e nenhum anunciante. Sua periodicidade foi irregular e nenhuma edição continha indicações de dia e mês de lançamento. Com dificuldades de circular, o periódico acabou sendo extinto logo em 1846, após completar cinquenta e duas edições. Os volumes contendo a coleção completa do Ostensor, lançados posteriormente, contavam 416 páginas de textos e 54 gravuras.  

(Bruno Brasil)