Adalgisa Nery, poeta e jornalista combativa

domingo, 7 de junho de 2020.
Notícia
Adalgisa Nery, poeta, jornalista combativa, Fundação Biblioteca nacional
Há 40 anos, num asilo no bairro carioca de Jacarepaguá, uma das maiores poetisas do modernismo brasileiro – e também uma das mulheres mais importantes da história do jornalismo brasileiro – vivia seus últimos dias. Depois de sofrer um acidente vascular cerebral em 1977, Adalgisa Nery, que no final deste ano completaria 115 anos, faleceria, no dia 7 de junho de 1980. Na época, quase sem um tostão, apesar dos 12 livros publicados, em mais de 35 anos.

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Homenagem Adalgisa Nery - Última Hora (RJ)
Homenagem Adalgisa Nery - Última Hora (RJ)

O primeiro poema de Adalgisa Nery publicado deu as caras na Revista Acadêmica, em 1937. Na época, era viúva do pintor Ismael Nery, um dos precursores do modernismo brasileiro: tendo se casado com apenas 16 anos no emblemático ano da Semana de Arte Moderna, 1922, sua relação com Ismael foi céu e inferno, marcada tanto por uma vida de efervescência intelectual quanto pela violência doméstica. Pouco depois de debutar na imprensa literaria, Adalgisa começou a colaborar com a célebre revista Diretrizes, de Samuel Wainer. O fato de seu então segundo marido ser Lourival Fontes, chefe do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), em pleno Estado Novo varguista, oferecia à revista uma censura mais frouxa. Acompanhando o marido em viagens ao exterior na década de 1940, trocou figuras, no México, com Frida Kahlo, Diego Rivera e José Orozco, sendo retratada pelos dois últimos.

Adalgisa se consagrou no jornalismo na década de 1950, no popular jornal Última Hora, também de Samuel Wainer. Sabendo que ela estava divorciada e com a saúde debilitada, o amigo e editor havia pedido a ela um artigo – colocando-o no segundo caderno. Quando recebeu o artigo seguinte, Wainer lera o sucinto aviso anexado ao texto: “Quero o caderno dos homens, o primeiro caderno”.

“Retrato Sem Retoque”, a coluna de Adalgisa em Última Hora, foi publicada de 1954 a 1966. Ali, seus artigos de denúncia fizeram-na comprar briga com muitos poderosos, o maior deles Assis Chateaubriand, dono dos Diários Associados – e desafeto de Samuel Wainer. Quando Chatô anunciou sua segunda candidatura a senador, em 11 de janeiro de 1955, depois de manobras políticas que incluiam a renúncia do senador eleito Alexandre Baima, Adalgisa disparou um artigo violento intitulado “Arranjos Políticos”. A briga foi feia – e longa, nos padrões da imprensa; continuou em vários artigos, indo parar até na edição de 7 de fevereiro de 1955 da revista americana Time. Na edição de 18 de fevereiro de 1955 de Última Hora, o alvo de Adalgisa era o lançamento da candidatura de Juarez Távora.

Por conta de sua combatividade, exerceu três mandatos como deputada, primeiro pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), depois pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), tendo atuado na Assembleia Constituinte do Estado da Guanabara, até sua cassação em outubro de 1969, pouco antes do Ato Institucional nº 5 (AI-5). Desse ponto em diante, até sua morte, o ostracismo.

(Bruno Brasil)