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![O Mosquito : Orgão do Povo (RJ) – 1892 - edição 13 O Mosquito : Orgão do Povo (RJ) – 1892 - edição 13](https://antigo.bn.gov.br/sites/default/files/styles/large/public/imagens/noticias/2020/0625-jornais-manuscritos-testemunhos-outro-mundo/cobertura-6580-jornais-manuscritos-testemunhos-outro-mundo.jpeg?itok=t6l9tjTg)
Um bom exemplo de jornal manuscrito é O Mosquito, um jornalzinho dominical escrito por José de Paula Assumpção, lançado por volta de novembro de 1891 na então cidade fluminense de São João Marcos. O leitor atento saberá que tal cidade não existente mais: foi demolida na década de 1940 para a construção da represa de Ribeirão das Lajes, em área hoje pertencente a Rio Claro (RJ), tombada como Parque Arqueológico e Ambiental de São João Marcos, voltado à preservação da história do Vale do Café. Dando conta de efemérides dessa extinta sociedade e de assuntos políticos de âmbito local e nacional, o rústico periódico era então distribuído gratuitamente, contando com “Collaboradores diversos”, dentre os quais, certo Francisco Rocha.
Além de artigos de opinião – colocações republicanas sempre favoráveis à figura do Marechal Deodoro da Fonseca, críticas porém ao governo recém-iniciado de Floriano Peixoto, ao engatinhar da República –, O Mosquito publicava croniquetas locais, curtas notícias de ordem informativa ou crítica, entrevistas, informes variados de utilidade pública, anúncios publicitários e mesmo boatos a respeito de figuras de São João Marcos ou de Mangaratiba. Em algumas ocasiões, o jornal manuscrito dava informações específicas a respeito de sua cidade: na página 3 de seu nº 35, de 18 de setembro de 1892, afirmava-se que, em “recenseamento feito em 30 de agosto do corrente anno, em todo o 1º districto d’esta cidade, verificou-se existir 6.922 almas, sendo homens 3.388 e mulheres 3.334”.
Via de regra, mesmo manuscritos, jornais do gênero de O Mosquito tentavam reproduzir o formato e a diagramação dos jornais tipografados. Sua desvantagem, naturalmente, era a tiragem: números consideráveis de exemplares exigiam, no caso, amanuenses, aqueles responsáveis por copiar manualmente cada edição, atuando, ocasionalmente, até como revisores de improviso. Um recurso para compensar a falta de reprodutibilidade técnica era a apresentação de notícias e opiniões em forma de verso, facilitando a memorização e o acesso ao receptor não letrado. Havia, nesse sentido, um intuito de difusão oral do que ali era escrito. Situado portanto entre as culturas oral e escrita, o jornal manuscrito oferece hoje uma imagem pouco ligada ao ideal de leitura introspectiva, em local quieto ou isolado. É fácil imaginar o jornalzinho de José de Paula Assumpção não como um hebdomadário distribuído regularmente a um corpo de assinantes, mas passado de mão em mão ou lido em voz alta em alguns dos lugares de interação social na São João Marcos de antanho: a paróquia local, a botica, o armazém, a delegacia... Bastaria um exemplar para cada um desses lugares. Outros tempos, outras realidades: outras formas de ler e de entender.
(Bruno Brasil – CPS)