O Prêmio Camões na visão dos jurados

quarta-feira, 1 de julho de 2015.
Notícia
Prêmio Camões, literatura
A a escritora portuguesa foi escolhida por unanimidade por uma comissão julgadora que se reuniu na manhã de quarta-feira, 17 de junho, na Fundação Biblioteca Nacional (FBN), composta pelos renomados autores Antonio Carlos Secchin e Affonso Romano Sant`Anna, do Brasil; Rita Marnoto e Pedro Mexia, de Portugal; Inocência Mata, de São Tomé e Príncipe; e Mia Couto, de Moçambique.

Os jurados destacaram os motivos que levaram à escolha do nome de Hélia Correia.

Inocência Mata, professora na Faculdade de Letras da Universidade Lisboa e sócia honorária da Associação de Escritores Angolanos,  destaca a problematização do lugar da mulher ao defender a escolha de Hélia Correia: “essa preocupação está presente desde o seu primeiro livro de ficção, Montedemo (1983), em que a voz feminina, protagonizada por Milena, emerge numa sociedade em mudança, num Portugal em regeneração com a Revolução dos Cravos, em que a mulher pugna por se libertar dos constrangimentos culturais (da tradição) para juntar a sua voz às reivindicações  políticas que então se faziam necessárias após quase meio século de ditadura.”

A autora integra pela terceira vez o júri do Prémio Camões, o que, segundo ela  é “mais do que um privilégio, uma honra”. Inocência vê uma responsabilidade importante recair sobre a comissão julgadora, “de visibilização de escritores que, sendo muito importantes no sistema de que fazem parte, sejam menos conhecidos do grande público”.

Rita Marmota declarou que “Hélia Correia tem uma obra consistente e densa, entre narrativa, teatro, poesia e literatura infanto-juvenil. Explora a natureza humana no que tem de bom e de mau, de cativante e de perverso, dando uma grande atenção a crenças, tradições, formas de solidariedade e modos de vida gregária. Sua exploração da natureza humana a partir de matrizes da Antiguidade clássica e também da literatura de várias outras épocas projecta-se no mundo contemporâneo, assim ganhando uma dimensão universal.”

Rita lembra que o “este Prêmio tem o nome de Luís de Camões, que é um dos maiores poetas do século XVI e que escreveu em língua portuguesa. É instituído pelos governos do Brasil e de Portugal. Ao homenagear escritores que se distinguem pela forma como usam a língua portuguesa, está estreitando os elos entre cantos do mundo, cidades e pessoas que falam a mesma língua.”

Já o autor moçambicano Mia Couto sustentou assim a opção pelo nome de Hélia Correia: “existe na poesia e nos textos de Hélia um rigor e uma contenção aliados a uma sensibilidade invulgar. Ela realiza uma viagem no tempo e resgata raízes da antiguidade clássica apenas para nos sugerir que esse olhar carregado de poesia permanece actual e moderno. Essa poesia é uma condição para nos reencontrarmos.”

O autor defende uma comissão julgadora com membros de diversas áreas diferentes da literatura com o objetivo de enriquecer o debate em torno dos premiados: “é importante que exista um balanço entre escritores e poetas, académicos e críticos literários de modo a que a selecção do premiado resulte de diferentes sensibilidades. Para mim, é sempre um momento de grandes dúvidas e hesitações: como comparar escritores, como escolher entre obras se elas, para serem literatura, se tornam incomparáveis?”

O escritor brasileiro Affonso Romano Sant`Anna lembra que “em Portugal, o resultado do Premio Camões é sempre muito divulgado, no Brasil nem tanto”. Por isso, ele sugere a criação de uma Coleção Prêmio Camões, com a edição de pelo menos uma obra ou antologia de cada autor premiado. “É a meineira de dar mais visibilidade ao prêmeio e aos autores. Uma tal coleção seria uma referência editorial importante e um gesto de aproximação de nossas culturas”, afirma.

O autor Antonio Carlos Secchin faz coro, destacando a importância da obra de Hélia Correia e lamentando a limitada difusão da autora no país: “tomara que o Prêmio facilite a divulgação, no Brasil, dessa importante escritora, cujo nome já vinha sendo cogitado há vários anos”.

Secchin se diz honrado com o convite para integrar a Comissão Julgadora: “já participei de mais de uma centena de júris, mas esse, pela dimensão  integradora de todos os povos de língua portuguesa, se reveste de caráter especial.” O autor acrescenta uma dimensão de aprendizado e crescimento pessoal ao interagir com outros escritores de língua portuguesa de grande projeção: “enriqueço-me  muito nessas participações, não só pelo contato com a obra de grandes  escritores, mas pela  prática do diálogo e pelo  convívio com as diferenças, inerentes a todas  as comissões julgadoras”, finaliza.